domingo, 15 de março de 2020

"Metal contra as Nuvens"

A morte do Renato Russo se deu cinco anos antes da morte do meu pai, e me lembro que naquela época, em 1996 eu chorei muito, parecia que alguém próximo da família havia falecido, lembro que na escola os alunos vinham me consolar, lembro também que passava horas e horas em casa ouvindo os meus CDs numa "fossa" desgraçada, mas sabe por que tudo isso ? Vou explicar... eu nunca fui fã, fanática por ninguém, nem por nenhum artista, eu apenas admiro a capacidade de alguns poucos que de alguma maneira consegue me tocar, e era assim com o Renato Russo, ele nas suas letras e composições traduzia a pessoa que eu era ou os sentimentos todos que me afligiam, então ao meu ver ele tinha muito de mim, Silvia, não sei se vocês conseguem entender.... só para exemplificar, tem uma letra que diz assim..."e nesses dias tão estranhos fica poeira se escondendo pelos cantos..." é uma cena em que me vejo menina, sentada no chão de cimento do nosso quintal, observando muito quieta e pensativa, aquele bolinho de poeira que se movimentava aleatoriamente com o vento anunciando que o tempo estava pra mudar, e ele tinha vida própria e brincava comigo, pra lá e pra cá, subia, descia, se escondia.... (desculpa, impossível não me emocionar)... outra letra muito significativa e marcante que traduzia muito de mim..... "quando quero desenho toda a calçada, acaba o giz tem tijolo de construção e eu rabisco o sol que a chuva apagou..." (uau, acho que hoje estou pegando pesado comigo)....

Exatamente hoje faz dezenove anos da morte estúpida do meu pai....há dezenove anos vivemos um dos dias mais tristes de toda nossa vida, uma dor que não se apaga, não se esquece, que lateja todo dia quinze de março, mas que depois adormece, como toda dor da perda que cumpre sua função....

Hoje é o dia da dor que renasce nas minhas relembranças...

..... logo depois do ocorrido, quando a minha cabeça ainda oca e com os meus pés pisando em nuvens, porque não havia chão nem terra pra pisar é que me veio assim por acaso a música "Metal contra as Nuvens" do Renato Russo... foram dez minutos de uma música na qual me entreguei por completo, me desfiz em lágrimas num choro compulsivo e muito doído....

Aquela música era o meu pai traduzido e tudo aquilo que ele viveu e passou, eu consegui enxergar ali o momento exato do tiro e tudo o que por ventura se passou em sua cabeça nos segundos que lhe restaram, do sopro de vida que ainda tinha.....

Em homenagem ao meu pai vou deixar aqui a letra da música que retratou a dor que senti e sinto até hoje. Ei-la :

*Metal Contra As Nuvens - Renato Russo

"Não sou escravo de ninguém
Ninguém senhor do meu domínio
Sei o que devo defender
Por valor eu tenho
E temo o que agora se desfaz

Viajamos sete léguas
Por entre abismos e florestas
Por Deus nunca me vi tão só
É a própria fé o que destrói
Estes são dias desleais

Sou metal, raio, relâmpago e trovão
Sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Sou metal, me sabe o sopro do dragão
Reconheço o meu pesar
Quando tudo é traição

O que venho encontrar
É a virtude em outras mãos
Mas minha terra é a terra que é minha
E sempre será minha terra
Tem a lua, tem estrelas e sempre terá

Quase acreditei na sua promessa
E o que vejo é fome e destruição
Perdi a minha sela e a minha espada
Perdi o meu castelo e minha princesa
Quase acreditei, quase acreditei

E, por honra se existir verdade
Existem os tolos e existe o ladrão
E há quem se alimente do que é roubo
Vou guardar o meu tesouro
Caso você esteja mentindo

Olha o sopro do dragão
É a verdade o que assombra
O descaso que condena
A estupidez o que destrói
Eu vejo tudo o que se foi
E o que não existe mais

Tenho os sentidos já dormentes
O corpo quer, a alma entende
Esta é a terra de ninguém
Sei que devo resistir
Eu tenho a espada em minhas mãos

Sou metal, raio, relâmpago e trovão
Sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Sou metal : me sabe o sopro do dragão
Não me entrego sem lutar
Tenho ainda coração

Não aprendi a me render
Que caia o inimigo então
Tudo passa, tudo passará
E nossa história não estará pelo avesso
Assim, sem final feliz

Teremos coisas bonitas pra contar
E até lá, vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos
O mundo começa agora
Apenas começamos




***Só ouvindo pra sentir e saber.
A estrutura da música é perfeita, ela tem uma dramaticidade que pra mim é muito real...
- É pai, depois que você se foi, nosso mundo, forçosamente, recomeçou....


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