quarta-feira, 15 de julho de 2020

"Amenidades- Primeira Comunhão"

Meu pai era da religião de Umbanda e minha mãe da religião católica e mesmo com crenças diferentes nada os impedia que um frequentasse a religião do outro, assim como nós, os filhos, que as sextas-feiras assistíamos aos rituais no Terreiro de Umbanda e aos domingos participávamos do eterno senta e levanta regido pelo padre durante a missa.

Tínhamos duas opções de religião para seguir mas, por influência de minha mãe, tendemos ao Catolicismo.

Fomos Batizados e Crismados ainda bebês e, posteriormente, quando alfabetizados, fizemos a Primeira Comunhão.

Eu devia ter uns dez anos quando fui matriculada no Catecismo (curso preparatório para a Primeira Comunhão), havia um colégio de freiras perto de casa e ao longo de oito meses uma vez por semana, religiosamente, estudei os preceitos da Bíblia.

Não podíamos faltar à missa aos domingos e tínhamos que saber todas as rezas na ponta da língua; aprendi o Pai Nosso, a Ave Maria, Salve Rainha, Creio em Deus Pai (Credo), os Dez mandamentos, e assim ao final do curso estava apta para a Primeira Eucaristia.

Aqui vale esclarecer que a Primeira Eucaristia ou Primeira Comunhão é quando os cristãos, no caso as crianças, depois de doutrinados (oito meses estudando a Bíblia) recebem pela primeira vez o Corpo e o Sangue de Cristo representados por uma hóstia, também vale ressaltar que antes de recebermos o corpo de Cristo precisamos obedecer algumas regras como a confissão e o jejum.

O confessionário, pra quem não conhece, é um estande pequeno e fechado entalhado em madeira nobre e lustrada, uma cortininha vermelha dá acesso ao lado de dentro onde há uma cadeira para o padre se acomodar, do lado de fora um genuflexório com degrau baixo para apoiar os joelhos e um encosto mais alto para pousar as mãos em oração, o padre e o penitente ficam em compartimentos separados e conversam entre si através de uma grelha ou látice conferindo-lhes privacidade e anonimato no ato de contrição.

Pois então, a fila á minha frente diminuía e meu coração acelerava... eu não tinha ideia do que iria confessar ao padre, acho que o meu primeiro grande pecado foi inventar os pecados que não tinha só porque era obrigada a me confessar antes da primeira eucaristia, e foram pecados tão bobos que com certeza o padre riu-se deles todos, paguei minha penitência com alguns Padre Nossos e outras tantas Ave Marias.

Outra regra básica era o jejum antes da eucaristia.

Estava tão ansiosa em receber o Corpo de Cristo pela primeira vez que obedeci o jejum à risca, minha última refeição havia sido no dia anterior por isso na hora da missa estava verde de fome e rezando para que tudo terminasse o quanto antes mas, não era uma missa comum, a igreja estava em festa, todas as crianças vestidas de branco e a liturgia lenta se estendia, até que chegou a hora do ritual da vela.

Bem, a vela da primeira comunhão não era uma vela comum, media aproximadamente uns trinta centímetros, branca e enfeitada com um adesivo do cálice sagrado e na base finalizava com um laço de cetim rosa para as meninas e azul para os meninos, depois de acesa a primeira vela a chama começou a ser repassada de vela pra vela até que todas estivessem acesas.

Neste momento me bateu um mal estar tremendo, o cheiro da parafina queimando, a fumacinha nebulenta da vela foi me entorpecendo, comecei a ficar tão branca quanto a cor do meu vestido, tudo ficou confuso, olhava para os lados e só via uma fileira de pequenas chamas flutuando no escuro até que não vi mais nada, foi aquele alvoroço !

Depois disso devo ter recuperado os sentidos e voltado para finalizar a liturgia, só não lembro como foi sentir na boca o gosto da hóstia pela primeira vez, registrado mesmo ficou o dia em que apaguei junto com a vela.



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