sábado, 29 de janeiro de 2022

"As Doenças do Brasil" - Valter Hugo Mãe

 Li o livro.

Quando o ganhei fiquei feliz por ser de um dos meus autores preferidos.

Sempre gostei muito das histórias do Valter mas o título deste livro em especial me incomodou bastante, tive quase certeza de que o livro me decepcionaria.

Pensei... como pode um escritor estrangeiro falar sobre "as doenças do Brasil" intuindo que no caso "doenças" não se referia propriamente as enfermidades e sim a um contexto sócio- político-econômico.

Resolvi então pular o prefácio, nada nem ninguém iria mudar as minhas impressões.

Comecei a leitura.

A princípio fiquei confusa com a narrativa, a estrutura da escrita diferia da normalidade e foi difícil entender o seu propósito até que o meu cérebro se alinhou com a história e as coisas passaram a fazer mais sentido.

O romance é simples.... conta a história da tribo dos Abaeté. Uma índia é estuprada por um branco e gera um filho mestiço,Honra, este é imagem e semelhança de seu progenitor mas seu sangue, seus costumes e suas crenças são da tribo dos Abaeté e quando jovem sai em busca de vingança acompanhado do amigo/irmão Meio da Noite.

Então o que me impressionou no livro ?

Sem dúvida nenhuma a genialidade do autor, a história é simples mas a maneira em que é contada fez toda a diferença nas minhas impressões.

Ao final o próprio Valter se explica e tudo se clareia ainda mais.

Findo o livro li o prefácio e concluí que fiz bem em não começar por ele, mas isto é uma decisão de cada um.

Quanto a minha avaliação posso dizer que o livro é simples(mente) surpreendente pela sua narrativa, valeu muito a leitura e continuo admirando ainda mais este autor.

Valter Hugo Mãe é um "génio".




quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

"Pausa"

 Pausei.

Precisava realmente pausar, colher informações corretas para que a História da Família Coelho desse continuidade com coerência e veracidade.

Fiquei pensando... quanto mais a história se aproxima dos fatos que vivi mais interferência pessoal haverá sobre ela e, de verdade, não queria que isto acontecesse, mas tem coisas que são mesmo muito difíceis de evitar e esta, com certeza, é uma delas.

Devo pensar muito antes de escrever, filtrar e ponderar. A História pode se resumir em fatos mas também em pontos de vistas diferentes e a mesma situação pode ser interpretada de enes maneiras e julgar as pessoas é um defeito de todo ser humano, sim, porque mesmo sem querer, inconscientemente o fazemos.

Quando alguém nos magoa diretamente, de um jeito ou de outro, lidamos com a situação mas, quando herdamos mágoas alheias o ressentimento fica porque não nos cabe perdoar, relevar ou esquecer, porque quem de fato competiria fazê-lo já não está mais entre nós.

Me comprometo ser o mais imparcial possível na minha narrativa mas, se as minhas mágoas se deixarem transparecer me perdoe não é esta minha intensão, farei as correções, meu objetivo é tão somente deixar registrado nossa História, nada mais.


Breve retornarei.

Grata.

Silvia.




segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte XII

 Aydinha, como era chamada pelos irmãos e primos, se equiparava na idade com os meninos e, era com eles Justi, Armando e Henrique a maior parte das brincadeiras.

Os meninos eram muito levados e certa vez foram todos ajudar a amassar barro no terreno da casa vizinha da dona Constância, era um barro colorido nas cores branca, vermelho e café, espécie de argila natural, gostavam da brincadeira pois o barro mole dava uma sensação boa nos pés, além de lhes fazer uso em outras brincadeiras como esculturas de bichinhos e comidinhas variadas. Mas nem sempre as brincadeiras eram autorizadas pela vó Emília e neste caso Aydinha havia sido advertida para não acompanhar os meninos, o que de fato não ocorreu, as escondidas acompanhou os primos na divertida tarefa, o que ninguém esperava era que ela, acidentalmente, se ferisse com um caco de vidro. 

Com o pé sangrando muito e rodeada pelos olhares aflitos dos meninos a maior preocupação de todos era como esconder da vó Emília sua desobediência, foi quando Virgílio, a caminho de casa, parou para ajudar. Analisou o ferimento e aconselhou : "estanca o sangue com o barro que vai sarar" e foi assim que fizeram.

Tive notícias que o sangue estancou, a ferida sarou e o que ficou foi uma cicatriz como lembrança mas, não sei dizer se Aydinha tomou a bronca pela travessura, o que me alegrou saber é que talvez este fato tenha sido a primeira aproximação entre meu pai e minha mãe, ela uma menina com nove anos de idade e ele também, ainda um menino, com os seus treze.

 Fico me perguntando se naquele despretensioso gesto de carinho e atenção não lhes tenham ascendido uma pequena chama no coração ?

Pode ser que sim, pode ser que não, talvez fossem jovens demais para perceber e sentir tais emoções.


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domingo, 16 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte XI

Foi no final da década de 40 que a Família Coelho se instalou definitivamente em São Paulo.

Para entender um pouco mais desta história, farei um parenteses para contextualizar  esta nova fase.

Como disse antes minha bisavó Emília e meu bisavô Manuel eram proprietários de um terreno que ocupava quase um quarteirão.

Este terreno foi repartido entre as três filhas do casal e suas respectivas famílias :

* Izabel, casada com Silvano, tinha quatro filhos : Justiniano, Ayda, minha mãe, Henrique e Elza.

* Maria do Céu, casada com Reinaldo, tinha três filhos : Armando, Ivone e Roberto.

* Antônia, casada com Amerino, tinha quatro filhos : Osvaldo, Orlando, Dulce e Valdir.

Todas as crianças  tinham pouca diferença de idade  e ficavam aos cuidados da avó Emília enquanto seus pais saiam para trabalhar.

Como a situação financeira era muito difícil os casais trabalhavam para sustentar suas famílias e todo dinheirinho extra era revertido em materiais de construção e assim eles próprios, muitas vezes com a ajuda das crianças, construíam esses pequenos cômodos de aluguel, então qualquer pedacinho da casa como um porão ou um puxadinho era uma possibilidade para lhes aumentar a renda.

E foi assim, no porão de uma das casas dos Massoranos, que a família Coelho se instalou.

Como dona Felicidade era costureira e a vizinhança bastante amigável não demorou muito para que todos se conhecessem.



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 e o mesmo foi repartido entre as três filhas do casal e suas respectivas famílias de modo que todos moravam vizinhos um do outro  

sábado, 15 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte X

 A  casa em que tio Salvador morava com a família situada na rua da Meação era composta por várias casinhas geminadas que abrigavam outras tantas famílias. Na sua fachada havia uma espécie de portal em forma de arco, de onde se avistava a rua Ana Camacho, antiga rua Caetanos. Mesmo com poucos cômodos tio Salvador abrigou a família da irmã até que estes tivessem condições de se mudarem.

Naquela época poucas ruas eram asfaltadas, os terrenos eram, muitas vezes, divididos com cercas de madeira, lembravam pequenas chácaras com suas hortas e árvores frutíferas.

 Os meus bisavós maternos, dona Emília e seu Manuel Massorano eram proprietários de uma quadra que ocupava duas ruas : a Rua Batista da Costa até a Rua Ana Camacho, neste terreno foram construídas, com muito esforço, suas casas de alvenaria  e outras pequenas moradias para futuros inquilinos. 

E foi numa dessas casinhas de aluguel que Zé Coelho se instalou com a família, tudo muito rústico e precário; do porão se fez o quarto, do lado de fora o banheiro e embaixo da escada uma minúscula cozinha.

Os meninos, Zequinha com quatorze anos de idade e Virgílio com doze anos começaram a trabalhar numa fábrica de fiação, emprego arranjado por tio Salvador, já dona Felicidade fez da costura sua profissão, enquanto isso Zé Coelho se ocupava com a política, trabalhando esporadicamente como cabo eleitoral em ano de eleições.

 Algumas fotos antigas, extraídas da Internet, que remontam o cenário da época :

Fachada do Antigo Cine Vitória - Água Rasa

Rua de paralelepípedo travessa da Av. Álvaro Ramos - Água Rasa

Vila Formosa começo do século XX

Rua de Paralelepípedo Água Rasa

Fachada, ainda existente, do Castelinho na rua Água Rasa

Entrada, acesso pela Av. Álvaro Ramos, do Cemitério da Quarta Parada

Ônibus Antigo sentido "Cidade" como era chamado o Centro de São Paulo



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sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte IX

 O nome completo de tio Salvador era : Salvador Pereira da Silva, seu ano de nascimento foi em 1.906 e seu falecimento ocorreu no ano de 1.975. A diferença de idade entre ele e sua irmã Felicidade era de aproximadamente dez anos, então concluo que, se a mãe deles faleceu quando Daia tinha apenas nove anos, Salvador teria pelo menos dezenove quando saiu de casa para o mundo.

O rumo que Salvador tomou foi o estado de São Paulo e foi trabalhando numa fazenda do interior chamada Santa Rita, que conheceu a imigrante italiana Lina Moran, que mais tarde adquiriu o sobrenome do marido, Lina Moran da Silva.

Antigamente quando os enamorados não recebiam o consentimento da família para se casarem era comum que fugissem, estratégia que muitos usavam para contrair matrimônio mesmo que este ficasse acordado em uma delegacia por exigência dos pais da noiva, e foi justamente isto que aconteceu com tio Salvador e tia Lina, depois dele próprio ter "roubado" sua pretendente.

Casados, tio Salvador e tia Lina tiveram quatro filhos : José Aparecido, falecido aos 12 anos de idade de apendicite, conhecida na época como "nó nas tripas", e os que vingaram, Eunice, Maria e Benedito.  Nesta época já haviam se mudado para a cidade de São Paulo, a princípio foram morar em uma casinha alugada em Ermelindo Matarazzo, depois se mudaram para a Rua da Meação, antiga Vila Regente Feijó, hoje Bairro do Tatuapé e com o passar dos anos compraram e viveram por toda vida em uma casa situada na Vila Formosa.

Foi justamente na época em que residiam na Rua da Meação que a família do tio Salvador acolheu a Família de Zé Coelho, constituída por Daia, os filhos pequenos Zequinha e Virgílio.


Primeira Comunhão década de 40
Prima Eunice






















Família do Tio Salvador década de 40












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quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

"Agradecimento a Prima Eunice"

 Ontem a noite o telefone fixo tocou, tão raro ouvi-lo tocar ainda mais naquele horário, era Eunice, prima de meu pai atendendo meu apelo na mensagem que lhe enviei pelo messanger do Facebook.

Fiquei feliz e empolgada com sua ligação.

Eunice é a filha mais velha do tio Salvador (irmão de minha vó Felicidade) com tia Lina; ela é um pouco mais velha que minha mãe, me disse ontem ter 83 anos.

Lembro da prima Eunice de alguns anos atrás, quando era mais jovem e pelo vigor de sua voz relembrei dela com a mesma aparência, conversamos cerca de uma hora, foi uma conversa descontraída e super agradável, conversamos um pouco de tudo, segundo ela, seu pai Salvador, era homem de poucas palavras e muito bravo, o que me surpreendeu pois a imagem que sempre tive dele era de um homem bondoso extremamente amigável que chegava em nossa casa sempre com um saquinho de balas para nos agradar.

Ela confessou que este comportamento devia ser pelo grande afeto que sentia por meus pais e por nós, os filhos, visto que representávamos o único elo de sua família.

Outras informações também me foram passadas, não muitas mas o suficiente para continuar escrevendo sobre a "História da Família Coelho".

Por isso deixo registrado aqui o meu profundo agradecimento a Prima Eunice que se preocupou em atender ao meu apelo.

Eunice, obrigada por sua colaboração.

                                                              Silvia. 13/01/2022




quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte VIII

A História da Mina de Cristal e a Vinda da Família Coelho para São Paulo


 Esta fase que narrarei a seguir  se compõe de fatos imprecisos porém não menos verdadeiros.


Instalados em Conselheiro Mata - Distrito de Diamantina MG, Zé Coelho continuou no garimpo com a ajuda do filho João, mas não por muito tempo pois na idade de servir o exército brasileiro o jovem rapaz retornou a Belo Horizonte para fazer o seu alistamento e cumprir com serviço militar obrigatório.

Zequinha e Virgílio ainda pequenos permaneceram ao lado da mãe e foram alfabetizados no Grupo Escolar da pequena cidade, contudo não há registros que tenham concluído o Curso Primário.

Dona Felicidade por sua vez manteve a família com o ofício de costureira. Na época costurava "Batinas" para os padres, vestidos de noiva, ternos para casamentos e vestimentas mais simples em geral.

Também foi nesta ocasião que Zé Coelho perdeu a chance de melhorar a situação financeira de toda família. As voltas com o garimpo descobriu sozinho uma mina de cristal mas, a euforia do achado foi tão grande que, a caminho de casa em uma de suas paragens bebeu um pouco demais e falou o que não devia.

A notícia do achado se espalhou feito pavio de pólvora, quando retornou a mina de cristal o local já havia sido tomado pela exploração desenfreada de muitos garimpeiros.

Em meio a todos estes acontecimentos dona Felicidade fica sabendo do paradeiro de seu irmão, há possibilidades deles terem se comunicado através de uma carta onde Salvador dizia estar casado com três filhos e vivendo na cidade de São Paulo - SP.

Desiludido com o Garimpo e incentivado por Salvador, Zé Coelho, dona Felicidade e os dois filhos Zequinha e Virgílio se mudam para São Paulo em busca de oportunidades e melhores condições de vida.



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terça-feira, 11 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte VII

 Ocasião em que Daia (vó Felicidade) é apresentada a Família de Zé Coelho- Belo Horizonte- MG


Tanto Zequinha quanto Virgílio (meu pai) foram registrados no Cartório Civil do Distrito de Conselheiro Mata, região localizada a 30 km de Diamantina - Minas Gerais.

Quando os meninos já estavam relativamente grandinhos Zé Coelho resolveu voltar a Belo Horizonte pois havia notícias que Sá Donana, sua mãe, estava muito doente.

Este retorno proporcionou a dona Felicidade e seus filhos conhecerem seus sogros e os filhos adolescentes do primeiro casamento de Zé Coelho com a falecida Balduína.

Infelizmente não há registros desse encontro.

Sá Donana veio a falecer na ocasião em que lá estavam e Zé Coelho fez questão de pagar as custas do enterro da mãe disponibilizando o único dinheiro que possuíam, proveniente de umas poucas gramas de ouro que havia negociado antes da viagem.

Era importante pra ele sentir-se por cima, mesmo se endividando e não tendo condições financeiras suficientes para fazê-lo. Quando o dinheiro acabou a família resolveu voltar para Conselheiro Mata e continuar no garimpo só que desta vez Zé Coelho levou consigo os dois filhos adolescentes, João e Manuel, afim de que ambos lhe ajudassem a garimpar; a filha mais velha Antalha se negou a acompanhar o pai preferindo manter-se em Belo Horizonte aos cuidados das tias.

Dona Felicidade fez o que pôde para acolher bem os meninos mas os conflitos familiares estavam presentes principalmente na animosidade entre pai e filhos.

Certo dia Zé Coelho implicou com a aparência de Manuel, o filho mais rebelde, obrigando-o a se barbear este, por sua vez, enfrentou a autoridade do pai e depois de uma séria e calorosa discussão Manuel decidiu sair de casa. Abandonou a família, caiu no mundo e ninguém, nunca mais, teve notícias dele.


Eis alguns registros que datam a época dos fatos :


Seu Virgílio Coelho (avô) segurando Antalha, a menina loira, João ao centro e no canto esquerdo da foto o caçula Manuel, os três filhos do casamento de Zé Coelho com Balduína.








Os Irmãos : à esquerda João Coelho (tio João), ao centro meu pai, Virgílio Coelho Neto e José Oliveira Coelho Júnior (tio Zequinha), à direita.













Dona Felicidade (Daia), primeira em pé á direita.


segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte VI

 A Vida de Casada da Jovem Daia (Vó Felicidade)


Logo após o casamento Zé Coelho montou em seu (novo) cavalo levando a jovem Daia na sua garupa, esta por sua vez carregava consigo apenas o que lhe cabia, uma trouxa de roupas e alguns pertences. Ambos se embrenharam mata adentro até chegarem na cabana construída por Zé.  A cabana era precária, próxima do garimpo, rodeada de árvores em um terreno de mato alto, mal se podia ver o sol. Imagino como tenha sido difícil pra minha vó aqueles primeiros dias encarando tão dura realidade.

Pela manhã antes de sair para garimpar Zé Coelho entregou a Daia uma garrucha velha munida apenas de um tiro com a seguinte recomendação : "Se mexer atire, seja homem, seja bicho, atire !".

Enquanto Zé Coelho se ausentava dona Felicidade usava seu tempo para limpar o terreno com um facão afim de que pudesse ver e aproveitar a luz do sol para colocar ordem na "casa".

Nesses primeiros anos em que viveram neste lugar, não sei precisar se dona Felicidade já exercia o ofício de costureira, profissão que a manteve até o final de sua vida, eu, particularmente, acredito que não, dado o isolamento em que se encontravam, talvez, a costura como profissão, tenha vindo anos mais tarde quando se instalaram na cidade.

Dessa fase tenho conhecimento apenas a data de nascimento dos seus dois filhos.

Em 1.934 nasceu o primogênito, José Oliveira Coelho Júnior (homenagem ao pai Zé Coelho) e com dois anos de diferença em 1.936 nasceu o segundo filho, Virgílio Coelho Neto, nome dado em homenagem ao seu avô paterno, seu Virgílio Coelho.

Do nascimento do primogênito, tio Zequinha, como o conhecíamos, não tenho registros mas, quanto ao nascimento de meu pai algumas histórias pitorescas nos foram confidenciadas por minha vó Felicidade.

História sobre o Nascimento de meu pai : Virgílio Coelho Neto.

Dizia ela que às primeiras contrações anunciando que o bebê estaria por vir, pediu ao marido Zé Coelho que fosse a cidade buscar uma parteira, este por sua vez, a caminho da missão, acabou se distraindo na caça por um tatu. Horas mais tarde voltou a cabana com a parteira e o tatu abatido em uma sacola. Dona Felicidade já havia dado a luz, ela própria cuidou de fazer seu parto preparando os apetrechos que iria precisar, inclusive uma tesoura velha para cortar o cordão umbilical. Coube a parteira apenas verificar se tudo havia sido feito do modo correto. Enquanto isto Zé Coelho extraia do tatu o seu sangue e com ele besuntou a criança envolvendo-a em panos que foram retirados somente no dia seguinte. Para surpresa de todos o sangue havia penetrado na pele do bebê. Este fato curioso fortaleceu a pele de meu pai e por muitas vezes o presenciei batendo forte no braço e dizendo orgulhoso : "Aqui não pego doença alguma, tenho sangue de tatu !" E realmente, meu pai era forte como um touro.

Outro fato curioso diz respeito ao seu registro de nascimento. Como moravam distante da cidade, registrar uma criança demandava disponibilidade e algum tempo. Quando Zé Coelho foi registrar o filho não soube precisar a data, registrando-o no dia 6 de agosto do ano de 1.936 sendo que a data correta seria dia 8 de agosto do mesmo ano 1.936. A pedido de minha vó, minha mãe ficou incumbida de jamais esquecer a data verdadeira do seu nascimento, por isso todos os anos, nós, os filhos e minha mãe, o cumprimentava  tanto no dia 6 quanto no dia 8, o que alegrava muito meu pai.


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domingo, 9 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte V

Cronologia dos Fatos e as Prováveis datas de nascimento dos meus Avós : Felicidade e Zé Coelho.

 A minha "suposta" lógica cronológica das idades e dos fatos :

Quando Zé Coelho conheceu e desposou dona Felicidade ele era um homem viúvo e maduro e ela uma jovem moça, se a diferença de idade entre eles era de 23 anos pré suponho que se Daia tinha 18 para 19 anos na ocasião, Zé Coelho teria pelo menos 41 anos quando a conheceu e se, de fato tivesse 41 a sua provável data de nascimento seria em torno de 1.893/94 e consequentemente Felicidade teria nascido em 1.915.

Para estas prováveis datas tomei como base a diferença de idade entre ambos e a data de nascimento de seus dois filhos, Zequinha 1.934 e Virgílio 1.936.

Com relação aos lugares onde estas histórias aconteceram não sei precisar ao certo, a referência que minha vó Felicidade deixou para minha mãe foi a cidade de Corinto, Conselheiro Mata e Diamantina por isso fui pesquisar a respeito.

Corinto era uma pequena cidade do município de Curvelo e passou de Distrito a Município em 1.923.

Depois disso várias leis com divisões territoriais estabeleceram como Distrito do Município de Corinto outras pequenas cidades. São elas : Distrito de Corinto, Andrequiçé, Contria, Santo Hipólito e Senhora da Glória (antigo N.S. da Glória), assim permanecendo em divisão territorial datada de 1-VII- 1.960.

Acredito que talvez um desses pequenos distritos tenha sido o local onde Felicidade nasceu e posteriormente se casou.


*Felicidade Pereira de Carvalho nascimento : 09 de Março de 1.915

                                                   Falecimento : 01 de Dezembro de 1.967


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A História da Família "Coelho" - Parte IV

O Primeiro Casamento de meu Avô Zé Coelho


 Nunca fui boa de matemática as datas dos acontecimentos e as idades das pessoas descritas são pré supostas através de uma lógica cronológica estabelecida por mim portanto com uma certa margem de erro, mas vamos acreditar que esta lógica possa ter me ajudado na aproximação da veracidade dos fatos. 

Na linha sucessória Zé Coelho talvez tenha sido o segundo filho de Sá Donana e seu Virgílio, visto que a primeira filha havia nascido na França, a data de seu nascimento não é precisa mas acredito que tenha sido  na última década do século XIX, ainda jovem, Zé Coelho casou-se com Balduína e com ela teve três filhos :

Antalha,

João Coelho (tio João) e

Manuel.

Quando as crianças atingiram a adolescência Balduína veio a falecer e Zé Coelho se viu sozinho com os três filhos para criar.

Não tenho informações sobre a ocupação de Zé Coelho nesta fase da vida em que fora casado com Balduína, o que me foi contado é que logo após ficar viúvo Zé decidiu "ganhar o mundo", deixando seus três filhos aos cuidados dos avós paternos e suas irmãs.

Talvez a situação financeira em Belo Horizonte não fosse das melhores e Zé tenha decidido se aventurar como garimpeiro pelo interior de Minas Gerais, levando-o, não sei se por destino ou acaso a um dos subdistritos de Corinto onde conheceu e desposou dona Felicidade, sua segunda esposa, a morena bonita de ancas largas que entrou na venda a procura de farinha.


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sábado, 8 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte lll

Acho que o grande protagonista da nossa história foi sem dúvida meu avô Zé Coelho, sem a sua audácia, quiçá falta de escrúpulos em aceitar  barganhar sua égua por dona Felicidade não estaria eu aqui contando todas estas histórias sobre a nossa família. Então vamos a ela.

Sobre os meus Bisavós Paternos : Ana e Virgílio, pais do meu avô Zé Coelho

A descendência de Ana e Virgílio Coelho talvez fosse Européia, digo isto porque há indícios de que Ana era portuguesa e uma de suas filhas nasceu na França antes de virem para o Brasil, os demais filhos eram todos brasileiros.

Sá Donana como era chamada casou-se com Virgílio Coelho e tiveram 7 ou 8 filhos mas apenas seis deles vingaram, sendo que uma das meninas nasceu na França, não sei dizer se na ocasião estavam apenas de passagem ou se havia algum parentesco por lá, o que me foi informado é que logo depois vieram para o Brasil onde fixaram residência em Belo Horizonte - Minas Gerais, final do século XIX

Os filhos de Sá Donana com Virgílio eram :

América

José Coelho

Conceição

Guiomar

Geraldo

Iaiá.

Todos os filhos permaneceram em BH exceto Zé Coelho que anos mais tarde veio morar em São Paulo.

Informações sobre os irmãos de meu avô :

Pessoalmente conheci quatro deles em ocasiões distintas. Lembro com nitidez que certa vez meu pai foi de carro a um hotel no centro de São Paulo buscar tia América e tia Iaiá para levá-las a Solemar afim de que ambas conhecessem o mar. Pegamos um final de semana horrível, o mar estava de ressaca e as ondas chegavam próximas as ruas, havia barrancos de areia e uma vegetação rasteira e espinhosa, não sei precisar quantos anos eu tinha, era pequena e por acidente uma onda forte me derrubou, senti o desespero de morrer afogada e o salgado da água na minha garganta quando um braço forte me resgatou. Talvez este acontecimento tenha fixado tia Iaiá e tia América na minha memória.

Com quinze anos eu e meu irmão Reinaldo tivemos a oportunidade de conhecermos Belo Horizonte, foi tia Luzia que nos levou a conhecer Tia Conceição casada com Júpiter casal com grandes posses e Tio Geraldo casado com dona Guiomar, homônima de sua irmã, que também era Guiomar. Geraldo morava próximo de tia Luzia e tio João, era marceneiro e fazia trabalhos artísticos em marchetaria, expunha suas peças numa feira de artes e artesanato que acontecia todos os domingos na Praça da Liberdade, foi nesta feira que fomos apresentados ao tio Geraldo e pude me encantar com a riqueza de seus trabalhos em marchetaria.

Acredito que Sá Donana e seu Virgílio Coelho não eram pobres, todos os filhos eram mais que simplesmente alfabetizados, todos sabiam tocar algum instrumento, há notícias de que Conceição tocava violino muitíssimo bem. Talvez o fato da condição financeira ser relativamente boa explique ou justifique o comportamento de empáfia que meu vô Zé Coelho manteve e nutriu por toda sua vida.



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sexta-feira, 7 de janeiro de 2022

"O Olho Mais Azul" - Toni Morrison

Não sou crítica literária nem tenho bagagem para tanto mas sempre gosto de deixar registrado minhas impressões toda vez que finalizo uma leitura.

Este livro me foi emprestado, e a primeira coisa que fazemos quando temos um livro em mãos é analisá-lo externamente, já ouviu aquele provérbio que diz "Não devemos julgar o livro pela capa ?" Esquece, porque julgamos sim, talvez o façamos até inconscientemente mas o fazemos, antes mesmo de saber do que se trata.

A capa do livro tem um layout bastante simples, ele é todo cinza, um cinza grafite bem escuro, sua textura é lisa e opaca, não é capa dura e a gordura da mão fica impressa com o seu manuseio, nele se desenha a silhueta de uma menina negra com um vestido rodado, lenço na cabeça a mão espalmada e o braço estendido jogando algo que a princípio não se define bem o que é e, um pequeno sapo pulando, fugindo do tal objeto, apenas isso mais nada, não há letras garrafais com o título do livro e muito menos se sobressai o nome da autora, podemos notar estas informações apenas na lombada, letras brancas sobre fundo azul.

Julguei que se tratasse, mais uma vez, desses livros que levantam bandeiras pela minoria, com aquele fundo socialista e politicamente correto, não raro hipócritas e felizmente me enganei.

Toni Morrison parece ser um nome masculino contudo é uma mulher negra nascida no começo da década de trinta nos EUA quem escreveu o livro.

A história é simples, e é contada de uma maneira bem peculiar, a primeira página do livro revela o seu desfecho e mesmo sabendo seu fim ficamos na curiosidade de saber como tudo sucedeu, "cá entre nós".

Pecola Breedlove é uma pré-adolescente negra e pobre, muito mais negra do que qualquer outra negra, com o cabelo muito mais pixainho do que qualquer outro e feia, muito feia, tão feia a ponto de causar escárnio entre os seus, ela reconhece no espelho sua feiura e seu desejo é ter olhos azuis, o milagre para  sua salvação.

Funde-se a história de Pecola outras histórias das pessoas que contribuem diretamente para o seu desfecho e eis aí o que me surpreendeu. Cada história contada é uma justificativa desculpando seus personagens dos seus atos humanamente perversos até mesmo o estupro da adolescente pelo próprio pai nos foi narrado de uma maneira que mais nos consterna do que nos revolta. A história de Pecola é triste, nos causa empatia, mais triste ainda é pensar em quantas Pecolas, ainda hoje, existem por aí, Pecolas de todas as cores, de todas as feiuras ansiando por salvadores pares de olhos azuis.

Bem, é isto ! "O Olho Mais Azul" não é um livro de enfeitar estante, é um livro para ser lido e ser passado de mão em mão.

Leiam ! A leitura é fácil e o livro é bom !

                                                                  Silvia.



quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

A História da Família "Coelho" - Parte ll

Sobre as circunstâncias em que meus avós paternos Zé Coelho e Felicidade se conheceram.


Quando Cândido ficou viúvo de Maria, Miguel, o filho mais velho, era um rapazinho e talvez Salomé a segunda  filha já estivesse casada com Francisco (Chico); o que sei de fato é que Felicidade tinha apenas nove anos de idade e não demorou muito para que seu pai Cândido se casasse novamente. "Baiana" era o apelido da madrasta, foi então que começaram os conflitos familiares, as crianças eram maltratadas, trabalhavam pesado e eram corrigidas com severas surras, tanto que motivaram Miguel a sair de casa e tentar a sorte em São Paulo atrás de melhores condições e foi na grande cidade, por motivos desconhecidos, que passou a se chamar Salvador. Salomé a irmã mais velha, casada com Chico, apiedou-se das irmãs menores e tomou pra si juntamente com o marido a responsabilidade de terminar de criar as meninas.

Saltam daí aproximadamente dez anos, Felicidade cujo apelido era "Daia" ajudava a irmã nos afazeres da casa.

No pequeno vilarejo havia uma única venda que servia os moradores locais e também aqueles que estavam de passagem como garimpeiros, caixeiros-viajantes e tropeiros. Estamos falando do interior mais remoto de Minas Gerais, um dos subdistritos da cidade de Corinto , município que faz parte integrante da região do Médio Rio das Velhas na Zona do Alto São Francisco, há 175 km pela estrada até Diamantina e um pouco menos de 100 km em linha reta. 

Era começo da década de 30, e o extrativismo mineral ainda era frequente naquelas bandas, a esperança de encontrarem uma pepita ou uma jazida de ouro impulsionavam as pessoas a se aventurarem mata adentro sempre com aquela ilusão e principalmente a ambição de "Fazer a Vida".

Certo dia faltou farinha em casa e Salomé pediu a Daia que fosse na venda buscar.

Justamente naquele dia Zé Coelho, garimpeiro de passagem, havia apeado sua égua em frente a venda e se aboletado numa das mesas quando seus olhos cresceram ao ver entrar aquela morena de ancas largas a procura de farinha.

Ouviu-se um murmúrio e um gracejo incontido por parte do forasteiro percebido maliciosamente por Chico, cunhado de Daia que também se encontrava no local e o mesmo sem vacilar perguntou a Zé Coelho : "Gostou dela ?" cuja resposta foi : "Ô se gostei !" Foi quando Chico propôs :" Quer casar com ela ?" Surpreso Zé perguntou se ele era o pai da moça esclarecendo-se depois que Chico era  tão somente seu tutor.

 Foi uma conversa ligeira e franca, Chico com ares de pai  e já de olho na égua apeada em frente a venda ofereceu Daia em casamento em troca do animal, sem hesitar Zé Coelho aceitou a barganha e assim ficou acertado um jantar naquele mesmo dia.

A noite Zé Coelho montado em sua égua chegou à casa de Chico e Salomé como o combinado,  Daia preparava um café na cozinha para a inusitada visita, totalmente alheia a conversa que se seguia, foi então chamada à sala e apresentada aquele homem desconhecido da seguinte maneira :" Daia este é Zé Coelho, seu futuro marido". Não houve reação, não houve recusa, talvez uma expressão de estranhamento e surpresa, uma aceitação inevitável de se cumprir uma ordem, nada mais.

Casaram-se na mesma semana, numa igrejinha local.



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A História da Família "Coelho"

 Esta história que vou lhes contar se trata da família do meu Pai, Virgílio Coelho Neto e me foi contada por minha mãe, Ayda Marques Coelho que fará, em fevereiro, 82 anos. Minha mãe nasceu com uma memória invejável e todos os fatos e nomes aqui descritos lhe foram confiados pela minha avó paterna que amava minha mãe como se fosse sua filha, dizia ela : "Ayda é a filha que Deus me deu".

É óbvio que por mais que eu me esforce haverá uma interferência pessoal dentro da minha narrativa mesmo assim vou me policiar e tentar ser o mais fiel possível para que a verdade prevaleça.

Sobre meus Bisavós Paternos : Cândido e Maria, pais da minha Vó Felicidade

De acordo com as minhas pesquisas o mais longe que consegui chegar na nossa ascendência foi em 28 de Setembro de 1871, data em que foi assinada e promulgada a Lei do Ventre Livre considerando "livre" todos os filhos de mulheres escravas nascidos a partir de então.

O pai da minha vó Felicidade se chamava "Cândido" e foi beneficiado com a tal Lei, não temos registros da data exata de seu nascimento, apenas o fato de ter nascido alforriado, sua mãe era negra e escrava portanto pressupomos que "Cândido" também deveria ser negro ou mulato.

A mãe de minha vó Felicidade se chamava "Maria" não temos informações sobre ela pelo fato de ter falecido quando minha vó tinha apenas nove anos de idade, talvez "Maria" fosse branca mas não há registros.

"Cândido e Maria" tiveram quatro filhos : "Miguel", que mais tarde mudaria seu nome para "Salvador", "Salomé", "Eva" e "Felicidade".

O nome completo de minha vó era "Felicidade Pereira de Carvalho" tinha a pele morena, mas os traços do rosto eram suaves os cabelos levemente encaracolados e finos, o quadril largo e as ancas pronunciadas lhe conferia as características de sua ascendência negra herdada pelo pai.



......continua...... 

 


quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

2022

 Desde a passagem de ano chove, uma chuva intermitente, persistente, se fosse uma chuva abrupta, forte, dessas que lavam a alma seria uma chuva boa mas não, é uma chuva que entristece, atemoriza a alma, não sei se deveria eu falar em presságios em meio ao vento e a chuva....meu coração anda deveras triste; quando era mais nova eu sempre pensava em correr e fugir na esperança de que se eu corresse a tristeza não me alcançaria e se eu me escondesse nenhum problema me acharia, hoje eu sei que isto é uma grande bobagem, não importa pra onde eu vá, serei sempre eu, minhas angustias, meus temores, meus problemas.

Ontem estive na minha mãe com meu filho e minha nora para tomarmos café, minha mãe ouve pouco e uma de suas estratégias para interagir é conversar sobre os assuntos que lhe aguçam a memória, muita coisa também vivi e muita coisa se avivou na minha mente, aquela conversa me deixou ainda mais triste, tão triste que me fez chorar, ali em frente a todos, um choro tímido, contido e muito sentido como se as lembranças fizessem as coisas acontecerem novamente diante dos meus olhos, disfarcei, mudei de assunto, enxuguei as lágrimas que secaram no meu rosto mas a tristeza e a melancolia ficou, ficou pra me atormentar a noite toda, tanto que me trouxe até aqui logo cedo, onde posso simplesmente escrever e desabafar sobre tudo que me aflige.

Com tudo que ouvi pensei e decidi escrever sobre minha família para que a história não se perdesse no vento, quero preservar estes registros fielmente, com nomes e acontecimentos narrados por minha mãe, a legítima guardiã e detentora da verdade dos fatos.

Sabe por que resolvi fazer isto ? Porque no final do ano passado no grupo da família surgiu o assunto dos nossos antepassados por parte do meu pai e em meio as nossas divagações minha mãe foi a única que não se manifestou nos confessando ontem, em meio ao café, que nunca havia lido tamanha bobagem que estávamos todos equivocados, então se estamos enganados vamos nos corrigir e assim pretendo escrever, deixar devidamente registrado tudo quanto eu possa absorver de minha mãe e assim será.

Quanto os meus temores e a minha tristeza há outras razões, mais atuais mas que por hora não quero pensar....